Carlos Humberto/ SCO/STF (14/08/2014)
A
nova postura do TSE abriu uma polêmica sobre os limites de
interferência do tribunal na campanha e das propagandas dos candidatos
Encarregado
de fiscalizar a eleição, o Tribunal Superior Eleitoral estará de
plantão no sábado 25, véspera do pleito presidencial, para receber
queixas dos comitês de Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) contra o
adversário. Se PT e PSDB se excederem, o TSE dará direito de resposta
ao concorrente quando a propaganda eleitoral já estará proibida. O
expediente extra foi aprovado nesta terça-feira 21. A norma resulta de
um julgamento polêmico, que rachou a corte, despertou dúvidas sobre seu
presidente, Dias Toffoli, contrariou o Ministério Público e levantou
suspeitas de censura eleitoral.
O controverso julgamento aconteceu na
quinta-feira 16. O TSE decidia sobre um pedido tucano para tirar do ar
uma propaganda petista que acusava Aécio de repetir a ditadura e
censurar a imprensa de Minas quando governador (2003-2010). A denúncia
contra ele tinha sido feita por Eneida da Costa, apresentada pelo PT
como ex-presidente do sindicato mineiro dos jornalistas.
O relator do caso, ministro Admar Gonzaga, era
contra o pedido. O depoimento de Eneida, disse, “desperta dúvida
razoável”, e Aécio dispunha de tempo de propaganda para se defender,
algo que não foi feito pelos advogados tucanos na ação. O ministro
contou ter recebido em seu gabinete relatos de episódios concretos de
possível censura, como a demissão do jornalista Jorge Kajuru da Band
mineira em 2004.
“O horário destinado à propaganda eleitoral
revela-se como ambiente propício para a divulgação de críticas e
manifestações de ordem política”, afirmou Gonzaga. “Sendo assim, entendo
que não é papel da Justiça intrometer-se no debate de ideias e
contestações, a ponto de colocar-se em substituição aos protagonistas do
certame.”
Presidente do julgamento e do TSE, Toffoli não
gostou do voto do relator. Mostrou-se incomodado com os ataques feitos
na propaganda eleitoral, que pare ele deveria ser só “propositiva”. Sem
que houvesse tal previsão no julgamento, passou a palavra à defesa do
PSDB. “É impossível provar que [Aécio] não perseguia
jornalistas. É prova negativa”, disse o advogado Marcelo Ribeiro, a
apelar por uma “intervenção” do tribunal contra o comercial do PT.
Também fora do script, o
advogado petista Gustavo Severo teve chance de argumentar perante o TSE
contra a representação do PSDB. Segundo ele, a oposição não negava a
acusação, como o relator já havia destacado em seu voto. “O Aécio pode
muito bem se defender em sua propaganda.”
Posição parecida foi defendida pelo representante
do Ministério Público Eleitoral no julgamento, Humberto Jacques de
Medeiros. Segundo ele, “há paridade de acesso aos meios de comunicação”
entre Dilma e Aécio neste segundo turno. “Ao ver do MP, a coisa mais
prudente e mais cautelosa é o tribunal não conceder a este momento
nenhuma medida, confiando na civilidade dos candidatos e não
interferindo este tribunal no nível do debate.”
A argumentação do MP não convenceu Toffoli.
Segundo ele, se o TSE não impusesse limites aos candidatos, “vamos
assistir ao baile do risca faca, não uma campanha presidencial”. O
ministro liderou então a derrubada do relatório de Admar Gonzaga. E
venceu, em uma apertada votação por quatro a três. Junto com Toffoli,
votaram os ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux e João Otávio de Noronha.
Com o relator, ficaram as ministras Luciana Lossio e Maria Thereza de
Moura.
O julgamento atendeu não só o pedido tucano de
retirada do ar da propaganda petista sobre censura à imprensa mineira,
como levou o TSE a assumir uma nova postura na reta final da campanha.
Dali em diante, disse Toffoli, a corte estava estabelecendo outra
jurisprudência, mais rigorosa. A publicidade na TV e no rádio não
poderia mais ser usada para atacar o rival, só para divulgar propostas. A
troca de chumbo ficaria restrita a entrevistas e discursos.
Esta nova atitude foi regulamentada nesta
terça-feira 21, em sessão que aprovou o plantão do TSE na véspera da
eleição, bem como o direito de resposta nos dias 23 e 24. O Ministério
Público fez um último esforço contra a norma, escrita pelo gabinete de
Toffoli. O procurador-geral Eleitoral, Rodrigo Janot, foi pessoalmente à
corte tentar impedir a aprovação da norma, em vão. “A mudança, na visão
do Ministério Público Eleitoral, causa surpresa aos candidatos a poucos
dias da disputa, não observa a jurisprudência reiterada, desatende o
princípio esculpido na carta constitucional e gera insegurança jurídica,
necessária ao Estado de direito e à regularidade do pleito.”
Desde sua decisão do dia 16, o TSE suspendeu sete
propagandas de Aécio e quatro de Dilma. Pelo lado tucano, foram
vetados, por exemplo, comerciais a dizer que o PT faz “a campanha mais
baixa, agressiva e mentirosa” e outro a reproduzir uma entrevista antiga
de Dilma na qual ela elogiava o então governador de Minas Aécio Neves.
Pelo lado petista, foram sacrificadas propagandas em que o ex-presidente
Lula chamava o tucano de “candidato dos banqueiros” e outra com uma
música sobre Aécio não ser votado por quem o conhecia.
A nova postura do TSE abriu uma polêmica sobre os
limites de interferência do tribunal na campanha e das propagandas dos
candidatos. No domingo 19, em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo,
o jornalista Jânio de Freitas escreveu que “o Tribunal Superior
Eleitoral tomou duas decisões que caracterizam censura à liberdade de
informação jornalística e à liberdade pessoal de expressão”.
Em uma eleição acirrada como a deste ano, a
discussão sobre os limites da campanha vem desde o primeiro turno,
quando Marina Silva ainda estava na disputa, e o comitê de Dilma
resolvera fazer o confronto aberto com ela. Na época, o cientista
político Wanderley Guilherme dos Santos disse a CartaCapital que
o País não estava acostumado com eleições politizadas e que se devia
lamentar que outras disputas não tivessem sido assim. O conflito aberto
de interesses, dizia, é próprio da democracia.
Mesmo tendo sido menos afetado até agora do que a
campanha de Aécio pelas proibições do TSE, o comitê de Dilma reclama
nos bastidores de que a decisão do tribunal atinge sobretudo o PT.
De acordo om um dos chefes do comitê, a campanha
dilmista precisava tornar públicos certos fatos negativos para Aécio
pois, de outro modo, eles não ganhariam notoriedade. O motivo seria o
desinteresse dos órgãos de comunicação. Era o caso das nomeações de
familiares de Aécio para cargos na gestão do tucano em Minas. E de
nomeações de Aécio pelo pai e pelo tio no início da carreira do
presidenciável. Na visão dos estrategistas de Dilma, era necessário
aumentar a rejeição a Aécio, graças aos altos índices da presidenta. “A
Marina e o Aécio foram desconstruídos por si mesmos, não por nós”, disse
o dirigente.
A poucos dias da eleição, a rejeição de Aécio já
supera à de Dilma, e pesquisas recentes mostram-no mais identificado com
a autoria das ofensas do que sua adversária. Mesmo assim, o comitê
dilmista preocupa-se com a nova norma do TSE. Sente-se exposto a um
eventual noticiário negativo sem ter meios para se defender. A resolução
aprovada pelo tribunal nesta terça-feira 21 garante direito de resposta
apenas para o candidato que for acusado pela propaganda adversária. Não
vale para notícias de jornais, revistas ou TVs.
Em Brasília, há quem veja com estranhamento a postura
do presidente do TSE, responsável pela reviravolta na postura do
tribunal. Advogado do PT no passado, indicado pelo ex-presidente Lula
para o Supremo Tribunal Federal, Toffoli estaria descontente com Dilma.
Em janeiro, a revista Veja publicou uma nota intitulada “De
aliado a adversário”, na qual dizia que o ministro “sente-se
desprestigiado por Dilma, que jamais o recebeu nem atendeu a seus
telefonemas”. Não há registro de que Toffoli tenha feito reparo público à
nota.
Em meados de setembro, com a campanha a pleno vapor,
Toffoli já tinha se colocado no caminho da presidenta. Em entrevista à
revista Época, criticara Dilma por conceder entrevistas no
Palácio da Alvorada na condição de candidata e por utilizar o local como
cenário de sua propaganda eleitoral televisiva. Para ele, “usar
símbolos de poder num ato de campanha é algo que a legislação não
permite” e uma “vantagem indevida”.
Fonte: CARTA CAPITAL
http://www.cartacapital.com.br/politica/a-polemica-intervencao-do-tse-na-eleicao-5257.html
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