Oportunismo político: Pastor-deputado e seu partido, o PSC, querem cargos no governo para desistir da CDHM, diz Isto É
No MARIA DA PENHA NELES
Marco Feliciano, o homem que desafia o País
Claudio Dantas Sequeira e Izabelle Torres - Isto É
TOLERÂNCIA, JÁ
O deputado Jean Wyllys é uma das principais vozes pela saída de Feliciano
TUMULTO E PRISÃO
O manifestante Marcelo Régis invade a Comissão de Direitos Humanos
na quarta-feira 27 e é detido pela Polícia Legislativa
Marco Feliciano, o homem que desafia o País
Apesar
do clamor nacional pela renúncia do presidente da Comissão de Direitos
Humanos, o pastor-deputado e seu partido, o PSC, ainda resistem, movidos
pelo oportunismo político. Para desistir, agora eles querem cargos no
governo
Los
Angeles (EUA), 1905. Em uma pequena igreja do subúrbio, o pastor
evangélico William Seymor promove conversões em massa, iniciando o
fenômeno que passaria a ser conhecido como avivamento. Belém do Pará,
1910. Desembarcam no País os pastores suecos Gunnar Vingren e Daniel
Berg com a missão de fundar a Assembleia de Deus, entidade que se
tornaria a maior denominação evangélica do Brasil. Um século depois, em
2010, o engraxate Marco Feliciano aluga uma sala comercial e registra em
cartório sua própria igreja: a “Assembleia de Deus – Catedral do
Avivamento”. Desde então, por meio dela, além de explorar economicamente
a fé alheia, professa o racismo, a homofobia e o machismo. Em suas
pregações, sejam elas no púlpito, sejam no Parlamento ou nas redes
sociais, Feliciano tenta impor o atraso a uma sociedade em inequívoca
evolução, na qual as vozes da intolerância são sufocadas cada vez mais
pelas dos defensores da igualdade entre os homens, independentemente de
cor, raça, gênero, credo e opção sexual. Para piorar, o pastor-deputado,
sem o menor constrangimento, em nome de ideias ultrapassadas com claro
viés autoritário e de conotação desagregadora, profana a memória dos
líderes religiosos que ele mesmo escolheu como patronos. Ao tachar um
negro de pessoa “amaldiçoada por Noé”, Feliciano desrespeita a todos,
incita o ódio e ainda omite de seus fiéis e eleitores que o pastor
Seymor, prócer do avivamento, era afrodescendente e já naquela época
defendia a liderança feminina nas igrejas. Ele também esconde debaixo do
tapete do preconceito e da intolerância que a Suécia, de Vingren e
Berg, mesmo sendo o berço do calvinismo protestante, não vacilou ao
reconhecer no início do século XXI o casamento homossexual e a adoção
por casais gays.
TOLERÂNCIA, JÁ
O deputado Jean Wyllys é uma das principais vozes pela saída de Feliciano
São
fatos históricos, mas que o deputado Marco Feliciano (PSC-SP) preferiu
escamotear. Ele dá de ombros aos protestos contundentes que pedem sua
renúncia da presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da
Câmara. Desde que foi indicado para o posto há quatro semanas, o
parlamentar passou a enfrentar protestos diários que começaram na
internet, se espalharam pelas ruas e invadiram o Congresso Nacional. Um
movimento inicialmente organizado por representantes de grupos negros e
homossexuais, mas que ganhou adeptos por todo o País. Estudantes,
intelectuais e artistas famosos, de todo tipo e todo credo, mostram que a
sociedade brasileira não tolera mais comportamentos intransigentes com
as diferenças. É incompreensível, afinal, que um parlamentar com
posições tão retrógradas e alvo de investigações judiciais esteja à
frente de uma Comissão de Direitos Humanos. A aberração política não
decorre só do oportunismo do PSC (Partido Social Cristão). É fruto
também da conivência e do jogo de pequenos interesses das grandes
legendas no órgão legislativo. Esses partidos – e aí estão incluídos PT,
PMDB, PSDB e outros – não podem ser eximidos da equivocada ascensão de
Feliciano ao posto e são corresponsáveis pelo caos instalado ali.
Ante
toda a comoção social, a lógica seria substituir Feliciano por qualquer
outro parlamentar. Mas o jogo político da Câmara é movido por regras
próprias e elas, normalmente, não seguem os interesses dos eleitores. A
tensa reunião de líderes na quarta-feira 27 escancarou esta situação. Ao
pedir que o líder do PSC, André Moura (SE), resolvesse o impasse, o
presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ouviu uma
resposta atravessada. Moura lembrou que o PSC tem o direito regimental
de indicar quem bem entender e que as outras legendas, hoje opositoras à
indicação de Feliciano, optaram por comandar outras comissões. O líder
do PSC não mentiu. Esta é uma das razões pelas quais o pastor-deputado, a
despeito de todas as pressões e manifestações País afora, ainda não
deixou o cargo de presidente da Comissão de Direitos Humanos.
Concorde-se ou não com a dinâmica – e o caso Feliciano mostra que ela
deveria ser revista para não produzir novas aberrações –,
historicamente, a divisão dos comandos das comissões permanentes leva em
conta a proporcionalidade dos partidos. A depender do tamanho das
bancadas, as legendas ganham a prioridade na escolha dos colegiados que
vão presidir. Dessa forma, os maiores partidos, como PT e PMDB, saem na
frente e comandam mais de uma comissão. Por anos, os petistas optaram
pela Comissão de Direitos Humanos, alegando afinidade da legenda com as
causas sociais. Este ano, porém, o PT preferiu a Comissão de Seguridade
Social e Família e as importantes comissões de Constituição e Justiça e
de Relações Exteriores. “O PT abriu mão da comissão e ela nos foi
oferecida. Nosso direito é indicar o presidente e o dever dos outros
partidos é nos respeitar”, resume o líder do PSC. Pode soar como um
absurdo, mas, pelas regras estabelecidas na Casa, nem mesmo o presidente
da Câmara tem poder para destituir Feliciano do cargo. A Alves e aos
demais líderes resta apenas a prerrogativa de apelar ao PSC pelo
bom-senso, que se expressaria na substituição de Feliciano para permitir
a retomada dos trabalhos pela comissão. Não tem sido, no entanto, uma
tarefa fácil. “O diálogo está cada dia mais difícil. Regimentalmente,
não há como solucionar o impasse imediatamente. E nos parece que os
integrantes do PSC não querem ouvir os apelos”, lamenta o líder do PSOL,
Ivan Valente (SP).
TUMULTO E PRISÃO
O manifestante Marcelo Régis invade a Comissão de Direitos Humanos
na quarta-feira 27 e é detido pela Polícia Legislativa
Por
trás da manutenção de Feliciano também há o velho e surrado oportunismo
político orientado por uma lógica eleitoral. Inegavelmente, o PSC –
legenda de pequeno porte composta por apenas 16 deputados – foi alçado à
ribalta política a partir da superexposição do pastor-deputado. Os
louros, seus dirigentes pretendem colher nas eleições de 2014. Membro da
bancada evangélica e comentarista político da Rádio Melodia FM, no Rio
de Janeiro, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) vaticina: “Ele não
renunciará.”
O
peemedebista, profundo conhecedor dos meandros da política, explica:
manter o pastor significa dividendos políticos. “Se ele renunciar, não
se reelege nunca mais. Se ficar, se reelege com 1 milhão de votos sem
sair de casa”, sustenta Cunha. Antes mesmo das eleições, no entanto, o
PSC já pensa em faturar politicamente. Na última semana, ao se despedir
da bancada, o vice-presidente da legenda, pastor Everaldo Pereira, disse
sorridente: “Acho que agora vão nos convidar para o banquete!”.
Everaldo passou a reunião explicando que “nunca antes o PSC tivera
tamanha visibilidade” e que agora o governo sabia da sua existência e
importância. O banquete a que se referiu nada mais é do que a divisão de
cargos no governo. O pequeno partido compõe a base da presidenta Dilma
Rousseff, mas até agora não teve direito de indicar ministros ou
funcionários de primeiro e segundo escalões. Agora, sente-se no direito
de pleitear espaço no consórcio governista.
BEIJAÇO E MANIFESTAÇÃO NO RIO
Ato contra Feliciano reuniu artistas na sede da ABI. Em protesto contra o preconceito,
a atriz Fernanda Montenegro beijou a colega Camila Amado diante das câmeras
Ato contra Feliciano reuniu artistas na sede da ABI. Em protesto contra o preconceito,
a atriz Fernanda Montenegro beijou a colega Camila Amado diante das câmeras
Na
campanha eleitoral de 2010, argumentam os principais líderes do PSC, o
apoio da legenda ajudou Dilma a conseguir os votos dos evangélicos,
mesmo depois de suas declarações polêmicas sobre o aborto. Apesar da
alardeada fidelidade, a bancada tem se queixado da dificuldade para ser
recebida por ministros, por exemplo. “Apoiamos a campanha e hoje somos
um aliado fiel que não tem cargos. Somos maiores do que outros partidos
mais consolidados, como PCdoB e PV. Mas que nunca teve direito a muita
coisa”, disse o pastor Everaldo Pereira à ISTOÉ. Não se sabe se as
reivindicações serão atendidas, na esteira das peripécias do seu mais
ilustre parlamentar, o deputado-pastor Marco Feliciano. Mas no PSC paira
uma certeza. O espaço na mídia e no mundo político conquistado pelo
partido no último mês nunca mais será o mesmo. Antes desconhecido e com
tempo escasso de propaganda eleitoral, o partido tem pregado seu
fundamentalismo cristão e conservador nos corredores do Congresso e nas
reuniões. A avaliação do partido é que a polêmica também beneficia o
próprio Feliciano, que atrai a curiosidade de mais fiéis – e potenciais
eleitores – a seus templos. Hoje, a “Catedral do Avivamento” possui 13
unidades espalhadas em São Paulo. O número de downloads de CDs e DVDs,
como “Caçadores de Jumenta”, quase dobrou em março. Até pouco tempo
atrás, Feliciano era um deputado desconhecido, eleito com pouco mais de
200 mil votos e candidato a permanecer no anonimato legislativo pelos
próximos dois anos. Agora, ele aproveita a onda de notoriedade e se
movimenta em todas as frentes. De olho na popularidade, resolveu até se
apresentar como negociador da liberdade dos torcedores do Corinthians
presos na Bolívia.
Apesar
de o PSC e Feliciano se ancorarem no regimento da Câmara e na
oportunidade político-eleitoral para não largar a Comissão de Direitos
Humanos, mesmo diante do clamor popular pela renúncia, a batalha ainda
não está encerrada. Depois da Páscoa, o presidente da Câmara, Henrique
Alves, pretende convocar Feliciano para uma reunião com a presença de
todos os líderes de partido. Assim, espera ampliar a pressão pela
renúncia. Em paralelo, ainda existe a ameaça de um processo por quebra
de decoro no Conselho de Ética. A assessoria jurídica do PSOL está
analisando as denúncias publicadas por ISTOÉ, indicando que o
deputado-pastor escondeu da Justiça Eleitoral que era dono de empresas,
entre elas um consórcio de imóveis que ele próprio induzia fiéis a
comprar durante sermões em seu programa de tevê. Marco Feliciano também é
acusado de contratar funcionários fantasmas e responde na Justiça por
estelionato e homofobia.
Montagem sobre foto: Adriano Machado/Ag.Istoé
Fotos:
ED FERREIRA/ESTADãO; Levi Bianco/Brazil Photo Press/Folhapress; Givaldo
Barbosa/Ag. O Globo; FABIO MOTTA/ESTADãO CONTEúDO; Pedro Kirilos
/Agencia O Globo
http://ajusticeiradeesquerda.blogspot.com.br/2013/03/oportunismo-politico-pastor-deputado-e.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário